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A Noite Escura Da Alma
A Noite Escura Da Alma
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A Noite Escura Da Alma

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– Guardiã?! É a senhora mesmo? Estava lhe procurando desesperadamente.

– Eu sabia, mas desconheço o motivo. A que honras devo a visita do sonhador, filho de Deus, a quem não vejo há tanto tempo?

Antes mesmo de tentar responder, nós nos abraçamos imediatamente e isto me deixa mais tranquilo e confiante. Naquele momento, eu tinha a plena certeza de que poderia contar com sua ajuda para desvendar mistérios e responder meus anseios mais profundos. Depois do momento de euforia, nós nos separamos, sentamos em frente ao outro e reiniciamos a conversa.

– Eu vim procurar respostas sobre a noite escura da alma, um momento que já vivi há aproximadamente dois anos, mas que ainda me deixa muitas dúvidas e inquietações. Então pensei um pouco e conclui que a montanha que me trouxe tanta alegria no passado podia ser o recomeço duma nova jornada, instigante e perigosa.

– Entendi. Mas poderia me dar um conceito para o que você chama de noite escura da alma?

– Bem, apesar de não ter evoluído o suficiente, posso lhe dar uma noção básica. Noite escura é exatamente aquele momento em que nos desligamos do sagrado, de Deus, e só conseguimos pensar em nossas próprias vaidades. É um momento onde as trevas agem bastante e isto pode condenar ou até mesmo salvar um indivíduo.

– Uma definição apropriada, mas incompleta. Saiba jovem, que a noite escura é muito mais profunda do que imaginamos e somente os espíritos mais evoluídos são capazes de controlá-la e entendê-la realmente. Está disposto a se arriscar mais uma vez? Se estiver, acho que poderei ajudá-lo em seu caminho. No entanto, devo alertá-lo que não vai encontrar todas as respostas de que necessitas exatamente aqui. Vai ser necessário muita coragem de sua parte e disposição para enfrentar novos e imprevisíveis desafios.

– Eu farei tudo que a mestra mandar. Pode crer que estou disposto a ir fundo nesse tema, nem que para isso eu tenha que fazer sacrifícios complicados e difíceis. Bem, qual será o primeiro passo desta vez?

– Primeiramente terás que conhecer com profundidade os sete pecados capitais, pois são eles que geralmente abrem as cortinas das trevas. Comigo você terá três desafios, e se for aprovado passarás a uma segunda fase. No total são três fases para que alguém consiga finalmente compreender o sentido da noite escura. Esteja preparado, pois não será nada fácil. Além disso, tenho que informá-lo que quem percorre este caminho corre tantos riscos que muitos já perderam suas vidas nele. Ainda assim quer continuar? Se disser sim, saiba que seu primeiro desafio está marcado para hoje à noite.

– Sim. Eu pagarei o preço necessário pelo tão ardoroso conhecimento. Estou pronto.

– Passe bem o dia. Estarei de volta à noite.

Com essas palavras, a guardiã se despede amigavelmente. Começo então a me preparar para a noite. O que será que me esperava? Continuemos juntos, leitor.

A espera do desafio

Continuo me preparando, sem perceber o tempo passa e chega o meio-dia. A partir daí, concentro-me no almoço, pois já estava com fome. Pego os alimentos que trouxera da mata e começo a prepará-los. Ao iniciar, uma leve preocupação perturba, por um momento, os meus sentidos, e me pergunto: O que a guardiã quis dizer com a expressão “muitos já perderam a vida em busca de respostas”? Será que o sentido disso era totalmente literal? Bem, de qualquer forma eu estava plenamente disposto a correr os riscos necessários para alcançar o tão ardoroso conhecimento e respectivo sucesso na aventura. Pensando nisso, constato que desde a primeira vez que eu cheguei na montanha tinha demonstrado a coragem, força e fé suficientes para realizar os desafios e encarar os obstáculos até finalmente ter a permissão de entrar na bendita gruta do desespero que era, naquele momento, a minha última esperança de sucesso. Analisando melhor esta parte da minha trajetória, acabo por concluir que eu tinha realmente possibilidades de alcançar o sucesso. Afinal, eu me transformara no vidente, um ser superdotado de dons, capaz de transcender o tempo e a distância em busca dos objetivos.

Depois da breve análise, resolvo me concentrar somente no almoço e me alimentar. Imediatamente após, decido me deitar na cama improvisada que fiz, pois eu precisava de um tempo para me recuperar e reunir forças para o desafio da noite. Com o tempo, a sonolência finalmente chega e um sono restaurador me envolve completamente. Durante o meu repouso, tenho sonhos reveladores, mas, indecifráveis. Depois da turbulência de um deles, acordo, e ao olhar o meu relógio de bolso percebo que já é quase noite. Apressadamente me levanto com o objetivo de observar a noite e esperar o contato da guardiã.

Orgulho

Ao sair, o cair da noite me deixa mais ansioso e nervoso. O que eu iria enfrentar? Em que consistiria este primeiro desafio? Eram algumas das perguntas que pairavam na minha mente perturbada. No instante posterior, tento me controlar e reafirmar a minha decisão para mim mesmo, a de que eu enfrentaria todos os obstáculos, sejam eles o que forem. A estratégia parece dar certo, pois fico mais confiante e com muita disposição, com aquele instinto aventureiro de escoteiro da missão anterior. Fico feliz e prometo a mim mesmo que iria descobrir todos os fascinantes aspectos da noite escura da alma, tão perigosa e tenebrosa. Assim, decido entrar na cozinha da cabana com o objetivo de preparar um jantar digno de uma guardiã, apesar de todas as dificuldades. E me lembro dos gostos dela e decido fazer uma sopa como da última vez em que nos encontramos. Era necessário não arriscar.

Depois de alguns instantes, finalmente apronto a sopa, ao prová-la fico feliz, pois ficara deliciosa, na medida do possível. Apesar da fome, não me alimento, volto a sair em busca de pistas naquele céu tão estrelado, deslumbrando-me com o aspecto dos astros, e por um momento eles brilham mais forte, parecendo querer me dizer alguma coisa. O que seria? Fico a imaginar inúmeras situações, até que sinto um toque leve por sobre os meus ombros. Ao olhar para trás, deparo-me com a guardiã mais radiante e fulgurante do que nunca. Ela se antecipa e inicia o diálogo.

– Está preparado, sonhador? Hoje você terá a oportunidade de conhecer o início de tudo, a criação da noite escura da alma. Saiba que este é um momento especial e reservado a poucos.

– Acredito que estou, mas antes queria convidá-la para tomar uma sopa comigo.

– Sim, claro. Aproveito para dar as orientações que se fazem necessárias para que você possa encarar o desafio com possibilidades de sucesso.

Depois do sim da guardiã, imediatamente entramos na humilde morada, e, durante o trajeto, um silêncio inquietador perdurou, parecendo antever os perigos que eu teria que enfrentar. O que seria de mim desta feita? Eu me perguntava isso, pois estava começando a trilhar um caminho totalmente desconhecido e imprevisível. Pensando um pouco no meu caso, tento reacender a confiança, pois ela era importante para alcançar o sucesso. Relembro que sou vidente, que não tinha nada a temer, apesar de tudo, e continuo a caminhar ao lado da guardiã. Nossos passos regulares e seguros nos levam ao nosso objetivo, a pequena e improvisada cozinha daquele casebre de madeira. Ao chegar, ofereço a guardiã o único tamborete disponível e começo a servi-la. Nós nos sentamos frente a frente e reinicio o diálogo há pouco interrompido. Decido ir diretamente ao ponto.

– Bem, guardiã, como será exatamente este desafio?

– Você deverá sair daqui a pouco da cabana e percorrer o topo da gruta à procura dum sinal. Quando chegar o momento, terás quatro opções: A pura luz, a passividade, o arrependimento e a noite escura da alma. Se escolheres o caminho mais adequado, então obterás as respostas necessárias para o completo entendimento do surgimento da noite escura da alma. Esse saber é muito importante para sua evolução como vidente e como pessoa. Porém, deves ficar alerta, pois se por acaso escolheres o caminho errado, encontrarás loucura, sofrimento ou até mesmo a própria morte. Seja sábio como sempre foi e escolha descortinar o véu dos mistérios mais profundos do universo. Saiba que poucos tiveram acesso a este conhecimento.

– Como devo me preparar para superar este primeiro desafio?

– Primeiramente, reze bastante para alcançar a proteção celestial. Depois disso, use o seu bom-senso e sabedoria, como quando você enfrentou a escolha dos dois caminhos na aventura passada. Naquela época, existiam duas opções: O caminho da direita, o da luz, que também é o mais difícil por representar renúncias e escolhas difíceis. Neste respectivo caminho, o indivíduo enfrenta muitas dificuldades, mas conta com a proteção celestial e certamente este é o caminho mais adequado rumo à evolução, cujo objetivo final é chegar ao Pai. Já o caminho da esquerda, o das trevas, é o caminho mais fácil, largo, e pertence a todos que se rebelam ao chamado do Pai, à sua missão. É também um caminho de aprendizado, que deve ser conhecido, mas não praticado. Da outra vez, você fez a escolha certa e conseguiu controlar suas forças opostas e isto poderá ajudá-lo desta vez. Saiba que quem controla suas forças opostas é capaz de realizar milagres.

– Entendi. Caso eu escolha o caminho errado, as consequências poderão mesmo me atingir?

– Não se preocupe. Provavelmente nada irá acontecer se você seguir minhas orientações adequadamente. No entanto, deves ter muito cuidado, pois a grande maioria das pessoas prefere ignorar a existência da noite escura nesse momento e se revestem de um falso eu, perfeito e inatingível. Geralmente as pessoas que agem dessa forma acreditam ser melhores do que os outros, pensam erroneamente que estão mais próximas de Deus e não tem o bom-senso de se autocriticar e tentar melhorar como ser humano. Saiba que a noite escura desse tipo de pessoa é a mais perigosa de todas. Há ainda outros que trilham a noite escura sem se dar conta e sem se importar com as consequências. A cada erro cometido, eles se afastam mais da luz e a não ser que alguém os ajude, acabam caindo definitivamente na perdição. Estes são todos que se drogam nos vícios da carne e do espírito. Existe ainda um terceiro tipo que trilham a noite escura por certo período de tempo, até algo transformar suas vidas. Este fato pode ser um conselho, uma reflexão ou um acontecimento casual do destino. O fato traz o arrependimento que é uma das chaves para se salvar dessa noite tão perigosa. Além destes, há outros tipos de noite escura, mas que não são preponderantes. Tenha paciência e cautela para conseguir superar os seus limites, avançar no caminho do conhecimento e não cair nas armadilhas do destino.

– Obrigado. Depois dessa explicação posso concluir que a minha noite escura foi a do terceiro tipo. Nela fui submetido a diversas experiências que fugiram da minha compreensão. Por isto que voltei aqui e quero obter o conhecimento que me fará capaz de entender e analisar as diferentes noites escuras da alma. Isto é absolutamente necessário para a minha evolução pessoal e minha carreira.

– Bem, só me resta agora desejar sorte em seu caminho. Você é um rapaz dedicado e merece alcançar o sucesso. Saiba que muitos corações irão aprender contigo os segredos para serem pessoas melhores e mais felizes. Certamente sua contribuição será importante e imensa.

Depois de dizer isso, a guardiã termina de se alimentar, olha para fora e volta-se para mim.

– Chegou a hora do desafio. Eu já vou indo e não se esqueça das minhas recomendações.

Imediatamente, ela se levanta e desaparece no meio da noite, deixando-me sozinho com as minhas inquietações. Neste momento, observo o meu relógio de bolso, constatando que a noite estava adiantada e um leve sono começa a aparecer. Penso por alguns instantes e decido me sacrificar em prol dos meus objetivos. Com esta decisão, pego uma lanterna na minha mala e avanço para fora da cabana. Ao sair, verifico que sua luz não é suficiente para me dar segurança num topo duma montanha sagrada e perigosa. Mesmo assim, não desisto e acredito em mim mesmo, na minha capacidade. Caminho alguns passos e tomo outra decisão: Iria começar a percorrer o topo do lado oeste, onde se localiza a gruta majestosa. Eu fiz isso, pois tinha uma desconfiança interior.

Determinado, dirijo-me à trilha mais próxima. No meio do caminho começo a ouvir barulhos de animais ferozes. E agora? Como eu iria me proteger? Tomado de medo, começo a repetir uma oração silenciosa e os barulhos acalmam imediatamente como se fosse um milagre. Fico então mais tranquilo e continuo na caminhada, concentrado no desafio. Novamente as dúvidas aparecem incessantemente e me pergunto: Será que sou mesmo capaz de superar este primeiro desafio tão difícil? Bem, da minha parte eu iria me esforçar ao máximo para começar a cumprir os meus objetivos: A procura por respostas sobre a noite escura e a ânsia do conhecimento.

Continuo caminhando e com o cri-cri intenso dos insetos já não consigo me concentrar mais. Como última alternativa, resolvo apostar no meu instinto e na minha experiência para não me perder na trilha. Passado algum tempo, os meus passos ágeis e rápidos me aproximam da gruta do desespero, local em que me tornei o vidente dos livros. Ao avançar mais e ficar de frente com ela, vêm as lembranças da última vez que estive aqui. Lembro-me de todos os detalhes, inclusive de que eu era apenas um sonhador que subiu a montanha em busca dum destino desconhecido. Ao galgá-la completamente, Tive o prazer de conhecer a guardiã, um espírito miraculoso capaz de entender os mistérios mais profundos do ser humano. Com o auxílio dela, realizei três desafios, um mais difícil do que o outro. Ainda na montanha, encarei o fantasma e a jovem com o objetivo de me afirmar sobre o que eu queria para mim mesmo. Depois de todas essas etapas, finalmente pude entrar na gruta do desespero, a gruta que poderia tornar possível o impossível. Ao entrar, derrubando todos os obstáculos, avancei cenários até chegar a câmara secreta. Nela, meus dons naturais foram fortalecidos e terminei por me transformar no vidente, um ser capaz de realizar milagres no tempo e no espaço. Com tudo realizado, saí da gruta, viajei no tempo, corrigi injustiças, ajudei alguém a se encontrar e finalmente reuni as minhas forças opostas e as de outro tempo. Tive êxito nesta missão e agora me sentia preparado para uma nova aventura, penetrar na densa noite escura da alma, algo que ninguém jamais fez antes. Cheio de ânimo, avanço mais, fico na entrada da gruta esperando por um sinal do sobrenatural, mas nada acontece. Com o passar do tempo, fico convencido de que a gruta não tinha nada a ver com o desafio atual e então me afasto dela e procuro outra trilha, rumo ao norte do topo da montanha. Encontro-a imediatamente, auxiliado pela claridade da lanterna e continuo a caminhar.

Ao pegar uma nova trilha, sinto a minha fé e esperanças renovadas, pois acredito que vou realizar os planos e encontrar o tão desejável sucesso. Com essa certeza e seguindo o meu instinto desenvolvido de vidente, em certo ponto, decido sair da trilha e entro na mata fechada. Mesmo enfrentando dificuldades, como espinhos que me ferem, continuo a caminhar no mesmo sentido, pois tinha uma certeza interior. Sigo neste ritmo uns dez minutos, até que do nada surge uma clareira. À minha frente aparecem quatro caminhos distintos e eu tenho que escolher um deles. Pressionado, começo a analisar todas as possibilidades. Neste caso não se trata de sorte ou destino, e sim de sabedoria. Dentre os caminhos há o caminho da pura luz, o caminho da passividade, o do arrependimento e o caminho da noite escura da alma. O primeiro pertence a todos aqueles que se entregam ao chamado do Pai, a sua missão. Certamente este é o caminho mais difícil, pois requer renúncias e escolhas que a maioria não está disposta a fazer. Já o segundo, o caminho da passividade, representa todos aqueles que persistem em seus erros sem se importar com as consequências, como a dor do próximo. Caso eu escolha esse caminho posso até chegar à loucura. Com relação ao caminho do arrependimento, este pertence a todo e qualquer ser humano que esteja disposto a mudar de vida, a perdoar e tentar entender o lado do outro. No entanto, a maioria das pessoas não consegue trilhá-lo por muito tempo, principalmente por causa do orgulho, exatamente o pecado capital que tentarei conhecer a fundo neste respectivo desafio. Caso eu escolha esse caminho, provavelmente irei presenciar e sentir muito sofrimento. Por último, há o caminho da noite escura da alma que representa os conhecimentos e as experiências místicas das trevas que todos em algum momento da vida passam. Depois de pensar mais um pouco, acabo decidindo que o caminho da noite escura era o mais apropriado a seguir naquele momento. Antes de seguir viagem, porém, relembro meus desafios anteriores especificamente quando tive que escolher, na aventura anterior, entre as duas forças opostas. Naquele caso, o caminho da direita foi a escolha mais acertada, pois representava o caminho da luz, enquanto que o da esquerda representava o caminho das trevas. Agora, a situação era diferente, pois eu tinha quatro caminhos e apenas um era a escolha mais adequada. Pensando mais um pouco, decido inverter os papéis e denomino o caminho mais a esquerda da pura luz e o próximo a ele seria o caminho do arrependimento. Já o caminho mais à direita, denomino de noite escura da alma e o próximo a ele de passividade. A fim de confirmar minhas suspeitas, crio uma aura ao redor dos caminhos e este método me dá o resultado esperado. Então eu sigo pelo caminho mais à direita em busca duma verdade que poucos conhecem.

Com um pouco mais de tempo de caminhada, os meus passos regulares me levam a um lugar plano, exuberante e extenso, onde no seu centro se localizava uma lagoa. Às margens da mesma, uma mulher acena para mim, chamando-me. Por curiosidade, atendo o seu chamado e me aproximo mais. Ao chegar de frente com ela, inicio o diálogo:

– É você a detentora do mistério da origem da noite escura da alma?

– Não, meu caro. Mas posso lhe ajudar.

Dito isto, a mulher se movimenta rapidamente e em poucos segundos se coloca exatamente atrás de mim, empurrando-me para dentro da lagoa. Sem defesa, entro em contato com a água. Neste instante, a montanha treme, as forças gravitacionais são abaladas, o céu escurece e meu corpo sobe numa velocidade gigantesca. Gradativamente vou perdendo meus sentidos e com isso as visões começam a aparecer. Concentro-me numa delas, e como se fosse uma viagem no tempo, vejo uma grande explosão e as consequências da mesma. Na respectiva visão, percebo a criação dos sistemas solares e todos os seus elementos constitutivos, representando a criação material. Além desta, ocorre simultaneamente a criação espiritual de todos os seres. Nesta, em particular, observo os exércitos angélicos sob o comando dum único senhor, auxiliado por um servo chamado Lúcifer, anjo prestativo e eficiente. Tudo ia bem no plano espiritual, até que um dia o Senhor dos Exércitos teve que se ausentar com o intuito de criar novas galáxias em universos distantes, e com isso deixou a administração do Céu com Lúcifer. Logo após a saída do Senhor, Lúcifer cresceu em importância e o poder lhe subiu. Num instante decidiu que não seria mais servo e organizou uma rebelião junto com outros anjos. Ele conseguiu adeptos de todas as hierarquias: Tronos, potestades, Ikiriris, arcanjos, anjos etc. No entanto, os planos de Lúcifer foram descobertos a tempo por outro servo: Miguel. Este não concordou com as ambições do seu irmão Lúcifer e organizou junto com outros anjos uma contraofensiva. Foi aí que a guerra começou. De um lado, os que apoiavam Miguel e Javé como seu único senhor. Do outro, os que apoiaram Lúcifer como ser supremo. Este momento foi o mais delicado de todo o Universo porque muitas vidas foram perdidas (bilhões) em prol do poder, ou seja, duma causa sem sentido. Depois de inúmeras batalhas, Miguel e seus anjos conseguiram encurralar Lúcifer e seus seguidores, e os venceu, trancando-os no temido abismo da Terra, em salas intransponíveis. Com isso, a guerra chegou ao fim e o Senhor voltou de viagem, ocupando o seu lugar devido e merecido. Ao voltar, Ele fez questão de parabenizar Miguel e seus comandados pela bravura nas batalhas e os fez alcançar postos mais altos na administração do Reino dos Céus. Quanto à Lúcifer, como castigo, foi transformado na figura dum dragão horroroso e o fogo do abismo foi acendido, cozinhando pouco a pouco os que ali se encontravam.

É nesse exato momento que surge a temida noite escura da alma e a sede de poder e o orgulho são causas primitivas dela. Depois de presenciar todos esses fatos, as visões desaparecem da minha mente e num instante estou de volta, às margens da lagoa, para minha surpresa. Observo ao redor e não vejo ninguém. Decido então voltar imediatamente à cabana, pois a noite já estava avançada. Com pressa, percorro o trajeto de volta em pouco tempo e com mais alguns passos já me encontro novamente na cabana. Dirijo-me imediatamente à minha cama em busca dum sono restaurador. Ao chegar exatamente nela, caio prontamente. Amanhã seria um novo dia e eu continuaria a percorrer o caminho temido das trevas em busca do tão ardoroso conhecimento.

Um outro dia

O dia finalmente amanhece e os primeiros raios do sol batem em meu rosto, fazendo-me acordar. Ao despertar reúno minhas forças e me levanto vagarosamente, espreguiço-me e decido tomar meu banho matinal. Com este objetivo, caminho rapidamente em direção ao banheiro improvisado. Depois de alguns instantes de caminhada, começo a me preparar para o banho. Dispo-me rapidamente, eu me ensaboo e jogo água fria sobre o corpo. Contato que me faz lembrar da noite passada. Analisando com carinho o desafio anterior, termino por concluir que a descoberta da origem da noite escura da alma e do sentido exato do orgulho me fizeram compreender em boa parte porque as pessoas afundam e permanecem nessa nuvem negra. Na minha humilde opinião, a maioria das pessoas estão muito ligadas a si mesmo e à matéria. Como consequência disso, elas não enxergam os erros que cometem diariamente em busca de poder, riquezas, ostentação social e vaidades. Com o passar do tempo, a situação espiritual desse tipo de pessoa se complica ainda mais porque permanecem errando e não tem a capacidade de se arrepender ou perdoar. E as consequências não param por aí. Gradativamente, a nuvem da noite escura fica mais espessa e sua influência acaba afetando os demais sentimentos da pessoa. Mais um passo e as pessoas ficam à beira dum abismo sem volta: Marginalidade, atos torpes, crueldade e falta de ética entre outros. Nesse exato momento, se não houver intervenção Divina ou angélica (Seres comprometidas com o bem), a noite escura pode até condenar. Contudo, há ainda uma pequena esperança enquanto a vida permanece, pois já tivemos exemplos de corações empedernidos que se recuperaram no último instante. Um destes foi o marginal crucificado ao lado de Cristo, que antes do martírio pediu perdão e que Jesus se lembrasse dele ao chegar em seu reino. Na mesma hora, para surpresa de todos, Jesus prometeu: Eu lhe garanto, estará comigo ainda hoje no Paraíso. Essa atitude do mestre mostra a grandeza de Deus e a força do perdão frente a influência da noite escura.

Esqueço todas as angústias e preocupações, concentro-me somente no banho. Retiro as minhas impurezas completamente e me ensaboou de novo e jogo mais água fria sobre o corpo. Quando estou pronto, pego a tolha, enxugo-me, visto uma roupa limpa e saio finalmente do banheiro. Ao sair me deparo com nada mais nada menos do que a guardiã. Ela inicia o diálogo.

– Bom dia, filho de Deus. Convida-me para o café? Eu estava passando aqui por perto e resolvi visitá-lo para saber como foi sua noite de ontem.

– Claro. Esteja servida. Acompanha-me?

A guardiã faz sinal que sim e caminhamos rapidamente em direção à cozinha improvisada. Com mais alguns passos, finalmente chegamos e eu ofereço a ela o tamborete. Começo a servi-la, ela se senta e continuamos a conversar.

– Guardiã, o segundo desafio está próximo?

– Está. Será hoje mesmo à tarde. Antes, porém, fale-me da sua experiência sobre o desafio anterior. Quero ter certeza de que você entendeu o suficiente para passarmos à próxima fase.

– Primeiramente, eu parti rumo ao oeste pensando que talvez o desafio tivesse alguma relação com a gruta milagrosa que me tornou o vidente. Porém, ao chegar lá, entendi que estava errado e então tomei outro rumo. Desta feita, fui para o norte do topo da montanha e ao sair da trilha, pouco tempo depois, eis que surgiram quatro caminhos como a senhora tinha me prevenido. Os caminhos representavam a pura luz, o arrependimento, a passividade e a noite escura da alma. Com mais essa prova da vida, reuni minhas forças e talento para desvendar os enigmas de cada um deles. No final de tudo, consegui e cheguei a algumas conclusões. Posso dizer que o caminho da pura luz pertence a todos aqueles que se submetem à vontade do pai e tentam cumprir fielmente a missão para a qual foram designados. No entanto, este caminho é o mais difícil de todos, pois o mundo oferece cada vez mais alternativas fáceis e prazerosas ao corpo e à alma, fazendo com que muitos desistam dele. Para ser mais sucinto, é um caminho de renúncias e escolhas. Já o caminho do arrependimento é de todos aqueles que têm a humildade suficiente para reconhecerem seus erros, mesmo quando a situação é quase sem volta. É aí que ocorre o milagre do renascimento e a partir disso as pessoas podem ter uma vida plena e cheia de felicidades. Com relação ao caminho da passividade, este representa a indiferença de todos aqueles que cometem crimes, mas que não se consideram absolutamente culpados. A noite escura desse tipo de pessoa é geralmente fatal. Por experiência própria, posso dizer que convencer um passivo é mais difícil do que criar outros mundos. Por último, o caminho da noite escura da alma representa o momento em que nos desligamos de Deus para só pensarmos em nossos interesses e vaidades. Dependendo de cada caso, as trevas podem condenar o indivíduo. É o caminho do conhecimento e da revelação. Optei por este, pois era a escolha mais acertada no momento. Depois de optar, encontrei uma mulher que estava às margens duma lagoa. Ela acenou para mim, eu me aproximei e ao chegar bem perto ela me empurrou de encontro às águas. O encontro produziu uma viagem há tempos remotos, quando o ser humano nem suspeitava de existir, que revelou o mistério que poucos conhecem. Com a revelação, meus sentidos foram despertados para entender a causa primitiva das trevas: O orgulho e a sede de poder. Especificamente o orgulho produz no homem a autossuficiência, uma espécie de perdição. Sendo autossuficiente, o homem pensa que não precisa mais de Deus para realizar os seus planos e objetivos e se considera o seu próprio senhor, dono do seu próprio destino. Além dessas características, o orgulho desencadeia mais uma série de pecados que termina por contaminar por inteiro a alma do homem. Com isso, a noite escura se fortalece cada vez mais.

– Esplêndido. Eu sabia que você era realmente capaz de entender a profundidade da questão. No entanto, saiba que isso é apenas o começo, pois a noite escura da alma engloba muito mais aspectos que ainda não dominas. Seja prudente em todas as situações e lembre que até hoje ninguém conseguiu compreendê-la realmente a não ser o mestre. Depois de tudo que ouvi, acredito que está apto a passar a segunda fase das que terás que percorrer.

– E como será esse próximo desafio? Como devo agir para obter novamente sucesso?

– Você deve procurar no topo o local chamado “abismo do arrependido”. Se agires com cautela e sabedoria poderás vencer novamente e encontrar o conhecimento do segundo pecado capital. Mas esteja alerta: Apenas os corações totalmente puros não são atingidos pelo fogo do abismo. Caso fracasses, saiba que sua alma ficará presa irremediavelmente e não haverá quem consiga lhe salvar.

– Obrigado pelos conselhos, mas acredito em mim mesmo. Eu estou totalmente confiante que terei sucesso, pois vou correr todos os riscos necessários para isso.

– Ótimo. Vejo que estás disposto. Admiro sua determinação em busca do conhecimento. No entanto, devo alertá-lo que tudo tem seu preço e que nada é absolutamente por acaso. Se tiveres sucesso em todas as etapas, o mistério da noite escura o ajudará bastante em sua longa carreira. Agora, só me resta desejar boa sorte e até o próximo encontro.

Dito isto, a guardiã terminou por se despedir e no mesmo instante desapareceu da minha vista como fumaça. A partir daí, o silêncio reinou na minha humilde cabana e isto me fez ficar pensativo. Como vencer essa nova etapa? Seria por acaso mais perigosa que a primeira? O que era exatamente esse local chamado abismo do arrependido? Eram tantas as perguntas sem resposta que me deixaram um pouco zonzo. Termino de tomar o café e passaria o restante da manhã analisando qual a melhor estratégia a ser adotada nesse caso. Depois de decidir, descansaria um pouco antes de iniciar essa nova etapa.

Avareza

A tarde finalmente se inicia e o calor abafado consegue me despertar do meu sono restaurador. Neste momento, observo meu relógio de bolso e posso imediatamente constatar que a hora do desafio estava bem próxima e então me levanto com a intenção de cumpri-lo. Com este objetivo em mente, saio a passos largos da cabana e procuro pensar na melhor rota para chegar ao tenebroso abismo do arrependido. Da última vez, já tinha passado pelo Oeste e pelo Norte. Estas opções estavam descartadas. Pensando mais um pouco, decido, desta feita, ir na direção sul. Definida a direção, continuou a caminhar e começo a preparar a mente para um impacto talvez inevitável, pois eu tinha que manter limpos coração e a alma com o intuito de superar o respectivo desafio. O que eu iria exatamente encontrar nesse local tão perigoso? Bem, eu não tinha a mínima ideia. A única certeza que eu tinha era de que me esforçaria a fim de absorver os conhecimentos necessários para tentar entender melhor a enorme complexidade da noite escura da alma. E isto não era tarefa absolutamente fácil.

Continuo a caminhar durante certo período de tempo na direção determinada, mas ainda não encontro nada. Será que estaria no caminho certo? Bem, apesar de tudo, eu tinha que cultivar mais a minha paciência. Persevero no caminho, mas paro um instante a fim de descansar um pouco. Aproveito para sentar um pouco naquele chão duro e seco e imediatamente relembro os conselhos da minha mestra, a guardiã: os de outrora e os atuais. Analisando cada um deles, termino por concluir que estava mesmo no caminho certo e reacendo novamente a minha confiança nos meus poderes e nos meus instintos. Com isso, levanto-me e continuo a caminhar na direção indicada. Alguns passos adiante, surge enfim uma sinalização: Uma seta apontando para a minha direita com o nome do local que eu procurava incessantemente: “Abismo do arrependido”. O impacto da boa notícia me deixa tonto, pois eu não esperava descobrir com tanta facilidade o local tão desejado. Resolvo seguir imediatamente o caminho indicado pela seta.

O que está acontecendo? Será que fui enganado? Já faz um bom tempo que tomei o caminho da direita e ainda não encontrei nada. Continuo a caminhar sem destino e com mais alguns passos chego à extremidade do topo onde me parece que só existe o vazio. Sem outra alternativa, resolvo sentar e pensar numa nova estratégia. Como começar de novo? Naquele momento eu não tinha nenhuma ideia, pois me sentia perdido, desolado e abandonado. Mesmo contra a minha vontade, o autocontrole outrora aprendido desaparece completamente e surgem a inquietação e o medo, apesar da minha recente evolução. Por alguns instantes, permaneço na mesma posição, até que algo inteiramente novo acontece: O chão da montanha treme; as forças gravitacionais são novamente abaladas, e, como se fosse um corisco, a mulher do primeiro desafio reaparece. Ela inicia o diálogo imediatamente.

– Quer descobrir os mistérios do abismo do arrependido? Saiba que posso ajudá-lo mais uma vez.

– Como? Não estou vendo abismo nenhum aqui.

– Não seja bobo. Para que um mortal penetre no abismo ele tem que primeiro desencarnar.

– Você quer dizer morrer? Isto está fora de cogitação, pois sou ainda muito jovem e tenho uma vida pela frente.

– Não é nada disso. Seu corpo não vai morrer literalmente. Apenas seu espírito sairá por alguns instantes para que possa contemplar o abismo e obter todas as informações necessárias. Não quer o conhecimento? Então pague o preço por ele.

– Está bem. Faça o que for necessário.

Com delicadeza, a estranha mulher me faz deitar e advêm calafrios que arrepiam e percorrem meu corpo por inteiro. Nesse momento, tento manter a calma, apesar das dúvidas que ainda corroem o meu coração. Sem se importar comigo, a mulher começa a fazer um ritual e suas mãos acabam por descansar em minha cabeça. Como consequência desta atitude, sinto ondas de energias sobre o meu corpo e a cada momento que passa me sinto adormecer. Mais alguns segundos, relaxo completamente e meu espírito se desprende da carne num solavanco. Ao sair do corpo, começo a flutuar e a voar sem limites. A sensação que isso proporciona é tão boa que me pergunto se vale a pena continuar a viver. Fico mais algum tempo aproveitando a liberdade, até que um túnel surge abaixo de mim e me suga ferozmente. Sem conseguir resistir, caio num buraco fundo, por um tempo que não sei mensurar, e bem no final chego num salão extenso onde em seu centro há uma porta misteriosa. A mesma se abre imediatamente após minha chegada e dentro dela sai um anjo que me rapta sem chances de defesa. Começa então uma viagem rápida que termina ao chegarmos num quarto. Eu entro no repartimento e encontro uma pessoa que já me espera. O anjo nos deixa a sós e com um olhar de piedade implora:

– Toque-me e saberás do que precisas.

Cheio de misericórdia, atendo o pedido desesperado e no exato momento do toque, visões começam a aparecer, perturbando meus aguçados sentidos. Em dado momento, vejo trevas, sol, luzes e cortinas da fumaça mais espessa. Aos poucos, tudo fica mais claro e então tenho a visão da respectiva história.

“Ryan era um empresário do ramo têxtil bem-sucedido, casado e com três belos filhos, Christian, Andrel e Marta. A relação com a família era normal, mas seus aspectos éticos nem sempre agradou a todos. Exemplos disso são o seu caráter intransigente como patrão, sua demasiada intolerância com as minorias étnicas e raciais e seu detestável comportamento contra mendigos e menores de rua. Com todo esse temperamento explosivo, não é de admirar como ele agiu certo dia. Na ocasião, Angel bate à sua porta, explica sua situação precária de vida e por fim pede algum dinheiro para comprar um lanche ou até mesmo um almoço para poder saciar sua grande fome. Como resposta, Ryan se irrita e declara que de nenhuma forma é pai dos pobres e bate a porta sem ao menos dar uma palavra amiga Àquele homem necessitado. Angel se revolta com os ricos e num momento de aflição solta uma praga contra Ryan. Anos depois, Ryan se encontra no mesmo estado de espírito e certo dia uma doença séria o assalta e mesmo ele lutando com seus fartos recursos não consegue evitar a tão temida morte. Ao chegar no mundo espiritual, ele vai a julgamento e sem nenhuma possibilidade de defesa sua noite escura o condena irremediavelmente. Ele desce, sem remédio, ao abismo onde sofrerá dia e noite (sem descanso) por seus erros cometidos em vida, enquanto que Angel, estava no céu onde é consolado.

A visão respectiva termina e imediatamente o conhecimento necessário preenche todo o meu ser. Quando estou pronto, a pessoa se despede me fazendo um pedido: Quero que você divulgue minha história para o mundo, pois não quero que meus filhos venham para o lugar de tormento em que estou. Prometo atendê-lo e ele finalmente se vai. O anjo reaparece no quarto e me arrebata pela segunda vez. Nós viajamos rapidamente e ele me deixa junto à porta, no salão. No mesmo instante uma força me puxa para cima e quando dou por mim estou de volta ao meu corpo, no topo da montanha do Ororubá.

Reflexões sobre o desafio

Tento me levantar, mas o esforço sobre-humano que fiz anteriormente me impede. Cheio de curiosidade, observo ao meu redor à procura da estranha mulher que me ajudara nos desafios, mas não consigo achar pista dela. Quem ela seria exatamente? Que poderes possuía? A única certeza que eu tinha é que ela demonstrara ser um instrumento maravilhoso do destino, com o objetivo de me auxiliar na busca pelo tão ardoroso conhecimento.

Um instante depois, esqueço um pouco a mulher e tento me levantar pela segunda vez. O corpo tenta resistir, mas com um pouco mais de esforço eu finalmente consigo. Em pé, poderia pensar melhor e assimilar por completo o conhecimento revelado no abismo. Quando me sinto pronto, começo a fazer o caminho de volta em direção à minha morada provisória. No meio do caminho, as sombras da história triste começam a me inquietar e então resolvo analisar o caso friamente. Ryan era o exemplo mais adequado de que os ricos correm sérios riscos quanto à sua salvação. Isto posto porque a riqueza e o poder trazem consigo conforto e status, mas também exige responsabilidade e desprendimento com as causas sociais. Outro exemplo, bíblico, mostra a avareza do rico e as condições desumanas dum pobre Lázaro. O final deles é igual ao da história de Ryan e Angel. Analiso em conjunto os dois casos e termino por concluir que a avareza é uma poderosa comichão da alma. Os personagens mudam, as situações são diferentes, mas para quem cultiva a avareza acontece o mesmo final trágico: A noite escura condena mais uma vítima a perecer nas trevas exteriores. Como mudar essa grande realidade? A resposta pode ser mais simples do que imaginamos. Trata-se de seguir o caminho da evolução, um caminho rumo ao Pai. Que requer renúncias e escolhas difíceis, que poucos estão dispostos a fazer.

Penso que o mundo seria bem melhor mesmo se seguíssemos os bons exemplos que a história nos deu: Jesus Cristo, Francisco de Assis, Martin Lunter King, Teresa de Calcutá, Irmã Dulce, Francisco Xavier, entre outros. Certamente, a noite escura não teria mais influência sobre nós. Bem, isso é apenas um sonho. A realidade é completamente diferente. Em sua maioria, as pessoas demonstram serem materialistas, egoístas e cheias de vaidades. Pode parecer pessimismo, mas na minha opinião o mundo continuará por muito tempo sobre o império da noite escura e para poder entendê-la completamente terei que cumprir novos desafios e realizar aventuras que sequer desconfio. Das etapas, já cumpri duas. Continuemos juntos, leitor, na busca pelo conhecimento.

Aproximo-me da cabana que construí com tanto esmero. À minha espera está a guardiã. Chego ao lado dela e a mesma iniciou o diálogo:

– Meus parabéns, vejo que está inteiro. Poderia falar sobre a sua experiência de hoje á tarde? O que você aprendeu?

– Inicialmente decidi começar pelo Sul, pois já tinha passado pelo Oeste e pelo Norte. Nesta respectiva direção, caminhei um bom período de tempo até conseguir encontrar alguma sinalização que me orientasse. Ao ser orientado, voltei a caminhar com bastante intensidade e com mais algum tempo me deparei com a mesma mulher do desafio anterior, que prontamente me auxiliou a achar o meu destino, o abismo do arrependido. Avancei no caminho e ao chegar exatamente no ponto que eu precisava, entrei em contato com a revelação do segundo pecado capital: A avareza. A história a qual fui submetido me ajudou a compreender a extensão desse pecado, o verdadeiro destino de todos que o seguem e tirei enfim algumas conclusões: A avareza é a chave pela qual a noite escura da alma arrebata fiéis. Ela se aloja no coração humano e nos sentidos, obstruindo a evolução respectiva do indivíduo. Além disso, provoca males secundários como a indiferença, o egoísmo e a intolerância. Exposto isso, podemos concluir que seus efeitos são catastróficos e muitas vezes provoca a condenação. Uma alternativa de combater esse tipo de pecado seria o altruísmo, que revigora a alma e abre os caminhos da evolução.

– Muito bem. Depois do que vi e ouvi, chego á conclusão de que você está mais próximo de compreender o sentido e a extensa dimensão da noite escura, pois já foram ultrapassadas duas etapas.

– E agora? Qual o próximo passo?

– A próxima fase será realizada amanhã e trata-se de uma das maiores fraquezas do ser humano: A luxúria. Esta será a última sob a minha supervisão, pois não estou capacitada a ajudar mais. Nas próximas etapas você será auxiliado por um hindu, que já mora aqui na montanha há seis meses. Fique tranquilo: Ele é especialista nos quatro últimos pecados capitais.

– Quer dizer que a senhora vai me abandonar? Não faça isso. Não se lembra? Nós estamos juntos nessa busca do conhecimento, desde a última aventura.

– Não leve a minha decisão para o lado pessoal. Não se trata disto. Saiba que não sou detentora de todo o conhecimento como você supõe. Mesmo para mim, a noite escura tornou-se um tema complexo e indecifrável. Para que você avance são necessários novos valores e ensinamentos, os quais não possuo e a grande maioria também não. Por isto e muito mais, devemos nos separar no momento, e quando evoluíres mais, quem sabe não nos veremos novamente.

– De qualquer forma, obrigado por tudo. Se não fossem seus conselhos eu não teria obtido progressos. A partir de agora, prometo que vou esforçar-me mais, a fim de descortinar o véu da noite escura da alma. Tudo dentro do possível, é claro.

– Não me agradeça ainda, pois ainda nos encontraremos outras vezes nesta aventura. Na próxima oportunidade, darei minhas últimas recomendações.

– Entendi. Uma última dúvida. A senhora acredita que eu sou digno do conhecimento a ser revelado?

– Pelo pouco que lhe conheço, é sim. Quando alcançares o objetivo maior, o tão ardoroso conhecimento, terá o poder de abrir a sua mente para verdades escondidas durante séculos. Aí terás as respectivas respostas.

– E aí serei feliz trabalhando no que gosto e esbanjando felicidade. Que ótimo. Espero que este momento não demore muito. Mais alguma recomendação?

– Não. Mais nada por enquanto. Agora, tenho que ir, pois já está ficando tarde. Boa sorte no próximo desafio!

Dito isto, a guardiã desapareceu. Ao ficar sozinho, encho-me de angústias e preocupações. Será que eu continuaria progredindo nesse caminho tão perigoso? Quem era exatamente este novo mestre, o hindu? Estas perguntas sem resposta imediata corroíam o meu coração e eu estava a ponto de realizar mais um desafio.

Luxúria

O tempo passa velozmente e um novo dia já amanhece. A sua chegada traz novas e inquietantes preocupações para um sonhador despreparado. Pergunto-me: Os pecados da carne seriam tão perigosos a ponto de afetarem a minha pureza? Pensando mais um pouco, decido continuar arriscando, mesmo que isso tivesse graves consequências para mim. Com a força dessa nova decisão, levanto-me e dirijo-me ao banheiro improvisado da cabana para tomar um banho. No caminho, tento deixar minha mente tranquila para aproveitar bem esses momentos de lazer. Entro, fecho a porta, começo a me despir e pego o balde de água que eu mesmo tinha separado na noite anterior. Inicio então o banho e ao jogar a primeira quantidade de água fria começo a refletir sobre o local sagrado em que estou. Penso um pouco sobre a montanha e sobre sua importância em minha vida. Termino por concluir que ela era mesmo sagrada pelo seu clima, sua história da qual eu fazia parte, desafios, mistérios escondidos e até a própria gruta. Continuo as conclusões e chego a um novo denominador comum: Nunca ninguém a conhecerá totalmente, a não ser que evolua até a perfeição. Nela, pude encontrar minhas forças opostas e, ao me tornar o vidente, pude controlar essas mesmas forças. Agora, buscava o conhecimento e entendimento sobre a noite escura pela qual todos nós passamos. Nesse caminho, tinha realizado duas etapas. Mas ainda faltavam sete, imprevisíveis, que ainda não tive tempo de pensar.

Tento me concentrar apenas no banho e esqueço, por um momento, as preocupações. A estratégia dá certo, continuo o ritual, me ensaboo, jogo mais água sobre o corpo e me esforço para retirar todas as impurezas. Quando me sinto totalmente limpo, pego uma toalha, enxugo-me e visto uma roupa limpa. Termino por sair do banheiro e vou à cozinha para preparar o meu café da manhã. Ao chegar, começo a estralar os apetitosos ovos de galinha que consegui na mata. Fico um pouco de tempo preparando a minha comida e quando ela fica pronta, alimento-me imediatamente. Aproveito para sentar um pouco, e quando faço isso, sobrevêm saudades de casa, da minha mãe e da minha vidinha. Isso tudo acontecia porque eu estava acostumado com uma refeição farta no café da manhã e com o calor familiar. Mais um instante passa e balanço a cabeça: Tudo seria bem mais fácil se eles me apoiassem na minha carreira e nos meus sonhos. Eu certamente teria mais um motivo para continuar lutando e me firmar cada vez mais como o vidente transformado pela gruta. Mas afasto esses pensamentos, pois eles só me prejudicariam agora. Então planejo a minha estratégia para o próximo desafio.

Com tudo definido, saio da cabana e tomo a direção leste, pois ainda não tinha ido por aqueles lados. O início do novo trajeto é feito de forma regular, sem muita pressa, pois ainda tinha que me preparar mentalmente para os impactos que porventura viessem. Neste momento era necessário o máximo de cautela, pois os desafios anteriores me provaram que os pecados capitais eram mais fortes do que eu imaginava. Provavelmente esta terceira etapa também não seria diferente. Fortalecida por esses pecados, chego a concluir que a noite escura, nesse caso, teria o poder de condenar. Como então se salvar? Era essa a resposta que eu tanto procuro. Depois de passar por todas as etapas da minha evolução pessoal, eu certamente terei uma posição a respeito. Por enquanto eu teria que cuidar do desafio atual. Sem mais preocupações, continuo a avançar.

Mais adiante, no campo da minha visão, aparecem três jovens vestidas como prostitutas. Apesar de ainda estar longe delas, posso constatar que elas são muito formosas e insinuantes. Quando elas percebem minha presença, acenam e eu resolvo me aproximar para mais averiguações. Ao chegar bem perto, a noite escura se condensa e o impacto me faz gelar. No instante posterior, elas se apresentam e me convidam a acompanhá-las. Sem pensar muito sobre o caso, resolvo aceitar e nós continuamos a caminhar. No meio do caminho elas me cercam e criam um círculo das trevas ao meu redor. Neste exato momento, a noite escura arrebata meu coração e sou forçado a lembrar de experiências que só me fizeram sofrer. Angustiado, tento me desvencilhar do círculo, mas ele é forte demais até para mim que sou um vidente preparado e evoluído.

Um tempo depois, uma sequência de portas é aberta na minha frente, e sou empurrado pelas prostitutas de encontro a uma delas. Em poucos segundos, minha mente e meu corpo passam por túneis onde os prazeres da carne são desfrutados. Ao ter essa experiência, estremeço com as imagens, pois o que é sagrado se torna um ato de pura selvageria. A fim de não sofrer tanto, fecho os olhos, mas mesmo assim não consigo ficar tranquilo. Com mais algum tempo, o círculo se comprime e viajando pelo túnel acabo por chegar a um amplo salão, onde alguém já me espera. Concentro-me mentalmente, tentando deixar limpos coração e alma, mesmo depois de tudo que vi e ouvi, e o círculo acaba se quebrando num estalo. Com isso, a noite escura se afasta por um tempo e me sinto mais reconfortado. Resolvo então me aproximar da pessoa que está no salão e ao tocá-la, as revelações e as visões começam a surgir.

“Felipe é um funcionário público de alta hierarquia e como consequência de seu trabalho possui uma vida estabilizada junto com os demais membros de sua família: Sua mulher, Catherine, e seus dois filhos, Lucas e José. Em sua vida familiar, Felipe se mostra bastante carinhoso e responsável. No entanto, quanto ao seu caráter, ele não se mostra tão perfeito, pois age de maneira desproporcional em algumas atitudes. Um exemplo delas, é que ele gosta de festinhas, geralmente acompanhado com ex-colegas de faculdade e nestas ocasiões aproveita para beber muito com o objetivo de perverter os sentidos e se engraçar com algumas mulheres sempre presentes. Foi nesse caminho que começaram as primeiras traições. No início ele se mostrou bastante cauteloso e não despertava muitas suspeitas. Porém, com o tempo, convenceu-se que sua atitude era normal de um homem e não se preocupou em ser mais discreto. Um belo dia, ocorreu o inevitável: Sua mulher descobre as traições e sua desilusão com o marido é completa. Ela acreditava que estava casando com a pessoa certa e que o amor do casal seria para sempre. Revoltada, briga com o marido, mas não se separa porque o amor pelos filhos é maior. Já ele não se importou em ser descoberto e continua em seu caminho de traições. O tempo passa, a situação não muda e com ela sobrevêm doenças graves que lhe provocam a morte. Ele vai a julgamento e a noite escura usa a dor da mulher para condená-lo. Ele é mais um que as trevas recolhem em seu galpão e este é certamente o fim de todos os pervertidos.

A visão termina, o homem se despede, recomendado que eu divulgue sua história no mundo. Concordo, e um vento forte me leva de encontro ao túnel. Em poucos segundos estou de volta ao topo da montanha, transformado pelo conhecimento do terceiro pecado capital. Agora, só me restavam seis etapas para a completa compreensão da noite que atemoriza todos os corações.

De volta à cabana

Eu estava exausto, mental e fisicamente, após a realização do terceiro desafio. Decidi retornar imediatamente a cabana com o intuito de descansar. Com este objetivo em mente, começo a dar os primeiros passos e minhas preocupações se concentram no próximo desafio e na misteriosa e incógnita figura do hindu que ainda não conhecia. Será que eu conseguiria assimilar os seus ensinamentos? Seria o mesmo, paciente, como a guardiã? O quarto desafio seria muito mais perigoso que os anteriores? Bem, eu tentaria achar as respostas dessas perguntas quando me encontrasse com o dito cujo. Por enquanto, eu deveria assimilar completamente os conhecimentos que obtive nos três desafios anteriores.